Homenagem: 100 anos de Nascimento

Publicado em 22/05/18

Maria Elizabeth Fleury Teixeira

Maria Elizabeth Fleury Teixeira

Cadeira nº 21

Jerônimo Augusto Curado Fleury

Simplicidade, Honestidade e Trabalho


Foto : Arquivo do Museu Ferroviário Araguari-MG
Figura 1 – Jerônimo Augusto Curado Fleury quando Diretor da Estrada de Ferro Goiás

Em agosto de 1981 falecia em Goiânia o mineiro de berço mas goiano de sangue e coração, Jerônimo Augusto Curado Fleury que, em vida, amou a terra goiana muito trabalhando para o seu desenvolvimento.

Filho de tradicional família goiana, do casal de primos, Julieta Augusta Fleury Curado (1879-1965), professora de piano, e do desembargador Maurílio Augusto Curado Fleury (1868-1952), ambos nascidos e criados na antiga capital do Estado, hoje, a histórica Cidade de Goiás, Patrimônio Cultural da humanidade.

Nasceu Jerônimo Augusto em 17 de maio de 1900, sendo o terceiro filho do casal e o único a vir ao mundo fora das terras goianas. Na época de seu nascimento, exercia seu pai, o cargo de Juiz Substituto na comarca de Estrela do Sul, então cidade goiana, muito movimentada pela extração de minérios e pedras preciosas. (Anos depois este trecho do Estado de Goiás passou a pertencer ao Estado de Minas Gerais, hoje, conhecido como Triângulo Mineiro).

Em 1903, retornou a pequena família a Goiás, quando Dr. Maurílio assumiu o cargo de Juiz de Direito da Comarca de Jaraguá, ocasião em que passou a Juiz de primeira entrância. Em 1907 transfe residência para a Capital do Estado, antiga Vila Boa. Por ato de 15 de junho de 1915 foi nomeado Desembargador do Tribunal de Apelação do Estado de Goiás.

Exerceu, concomitantemente, o professorado na Academia de Direito, sendo um dos fundadores da Faculdade de Direito de Goiás, onde ocupou a cadeira de Direito Civil. Lecionou também no Seminário Santa Cruz de Goiás e no Liceu, onde exerceu o cargo de vice-diretor por alguns anos. Foi também Diretor do Gabinete Literário. Na política teve atuação rápida como Deputado da Constituinte.

Teve o casal numerosa descendência, ao criar e educar treze dos dezesseis filhos que Deus lhe confiou: Sebastião Ewerton Curado Fleury, 1898, Juiz do Tribunal Regional de Trabalho, BH-MG; Augusta Henriqueta Curado Fleury,1899, funcionária do Min. da Educação e Cultura; Jerônimo Augusto Curado Fleury,1900, Engenheiro Eletro-Técnico e Civil; João Alfredo Curado Fleury, 1902, Médico; Mariana Augusta Curado Fleury(Nita), 1903, Func. do Ministério da Fazenda; Augusto César de Pádua Fleury,1905, Advogado e Professor; Maurílio Augusto Curado Fleury, 1907, General de Brigada; Julieta Augusta Curado Fleury(Sinhazinha),1910, Func. da Embaixada da ONU; Romeu Augusto Curado Fleury, 1912, Engenheiro Civil; Geraldo Curado Fleury, 1913, Advogado Trib. Regional de Trabalho,MG; Helio Domingos Curado Fleury, 1915, Contador e Bancário; Celso Augusto Curado Fleury, 1917, Contador e Bancário; Marilia Augusta Fleury Seild, 1920, Contadora Func. do Min. da Fazenda.

Dona Julieta, que desde mocinha cantava e tocava piano em saraus e festas familiares, depois de casada passou a lecionar piano e nos saraus que gostava de promover em sua casa havia sempre apresentação de alguns de seus alunos e também dos filhos, que, desde pequeninos, recebiam da mãe aulas de música e incentivo para a escolha e estudo de um instrumento musical.

aconselhado por ela, se interessou pela flauta que aprendeu com prazer e tocava muito bem. Em reuniões, sempre que solicitado, acompanhava com sua flauta a mãe, a irmã Augusta ou Sinhazinha ao piano. Pela exigência do aprendizado musical, os filhos tinham pouco ou quase nenhum tempo para as brincadeiras com os primos e amigos. Talvez, por isso, fosse considerada pelos parentes uma mãe exigente, severa e enérgica.

Sempre ouvi, no entanto, de meu pai e tios, inúmeros relatos das brincadeiras e passeios acontecidos na infância, sendo possível perceber ter sido alegre e despreocupada, embora com mais estudos que a maioria dos amigos da época. Sabiam que por serem filhos de Juiz, tinham por obrigação se portarem bem em casa e fora dela. Aos amigos, Des. Maurílio explicava ser rigoroso com o estudo e educação dos filhos porque assim, também fora educado. Estudara interno, desde os 12 anos de idade, e achava ser esta a mais certa educação para os filhos homens na adolescência.

Jerônimo após se formar no Lyceu de Goiás seguiu, aos 14 anos, para se preparar para o ensino superior. Não o curso que desejava estudar, o de Medicina. Este, segundo explicação de seu pai, seria o curso a ser estudado por seu quarto irmão, João Alfredo. Para o terceiro filho escolhera, seu pai, o curso de Engenharia lhe afirmando ser uma profissão de futuro, naquele Brasil que muito teria que crescer. Seu irmão mais velho, Sebastião, há dois anos já se encontrava em Belo Horizonte, cursando Direito e, pelas cartas que escrevia, estava se saindo satisfatoriamente.

Não querendo contradizer o desejo pai, Jerônimo seguiu em sua companhia para Itajubá, preparando-se para ingressar no Instituto Eletrotécnico e Mecânico daquela cidade de Minas Gerais, onde se classifica em 3º lugar. Em carta enviada aos pais, comunicou o sucesso de sua classificação. O fato motivou a publicação em jornal goiano, que cumprimentou o corpo docente do Lyceu de Goiás pela excelente qualidade do ensino ministrado.

Iniciou-se, para ele, anos de muito estudo, sacrifício e saudades da família, pois a grande distância o impedia da regular comunicação. Outra dificuldade enfrentada foi em relação aos livros didáticos, que não eram traduzidos em português. Todos os livros de seu curso de Engenharia eram importados, obrigando-o a se dedicar com mais afinco ao estudo do inglês, francês, espanhol e até a língua alemã teve que aprender.

Nas férias, aproveitava para se dedicar às línguas. Era quando a saudade da família aumentava porque tanto a “república” onde morava quanto a cidade ficavam vazias dos estudantes e eram poucos seus colegas de Itajubá.

Para fugir da tristeza e saudade, adotou ele o conselho de sua mãe: todos os dias escrevia uma carta a ela contando o que fizera, suas alegrias e tristezas. Assim, desabafava suas angústias e... guardava a carta na gaveta. No final da semana, quando o tempo era maior, relia tudo para então reescrever nova carta que enviaria a sua saudosa mãe.

Finalmente após oito anos de estudos recebeu o diploma de Engenheiro Eletrotécnico e Civil do Instituto Eletrotécnico e Mecânico de Itajubá, Minas Gerais, em dezembro de 1922, aos 22 anos.


Figura 2 e 3 : Arquivo de fotos da família

Jovem de espírito inquieto e alma sertaneja, afeita ao calor humano e jeito de ser dos goianos, possuía Jerônimo Augusto um coração grande e amigo, sendo observador e calado.

De volta a sua terra, passou pelo Rio de Janeiro, Capital Federal, inscrevendo-se a uma vaga de Engenheiro assistente no Ministério de Viação e Obras Públicas. Por alguns dias permaneceu na Capital Federal, fazendo contatos e revendo amigos. Seguiu, depois, para Goiás, após confirmação do contrato de serviço para daí seis meses.

Seu retorno a Goiás, depois de tanto tempo afastado pelos estudos, movimentou as rodas sociais e embalou o sonho de muitas mocinhas casadoiras. Sua mãe e irmãs aproveitaram sua presença para acompanhá-lo em festas e pequenas viagens a Corumbá e Pirenópolis, revendo parentes e amigos. Nessas viagens, Jerônimo procurava fazer contatos profissionais, pois desejava um dia voltar para Goiás.

Quando da chegada em Goiás do novo Bispo, Dom Emanuel Gomes de Oliveira, em 1923, ele, guiando o fordeco de seu pai, acompanhou a comitiva do Tribunal de Apelação nas boas vindas, no Arraial de Areias. Alguns meses depois, recebe Jerônimo seu primeiro convite de trabalho como engenheiro, vindo do novo Bispo Dom Emanuel. Aquele prelado necessitava levantar o patrimônio de várias paróquias cujas terras, doadas pelos fieis, não se encontravam regularizadas.

Segundo o Bispo, havia apenas uma preocupação: ele não tinha como pagar o serviço no momento. Mas, que confiasse em sua palavra, pois o pagamento viria com a providência de Deus.

Foram, então, levantados os patrimônios das cidades de Goiás, Itaberaí, Bela Vista, Bonfim (atual Silvânia), Formosa, Planaltina, Campininha das Flores e outras mais. Esse levantamento topográfico das áreas doadas à Igreja foi realizado de sol a sol, ao lombo de um cavalo cedido pela paróquia ou pelo fazendeiro, autor da doação. Alguns meses de trabalho foram suficientes para que nascesse entre eles, Dom Emanuel e Jerônimo, forte laço de amizade e consideração que os acompanharia por toda vida.

Em março de 1924, retornou ao Rio de Janeiro, onde passou a morar.

Assumiu o serviço de Engenheiro ajudante no Ministério de Viação e Obras Públicas. Por essa época, trabalhando na exploração de minérios no subsolo, lhe acontece um acidente de trabalho: a explosão inesperada de uma bomba machuca alguns operários e o deixa com seqüela irreversível. Perdeu seu ouvido esquerdo.

Por Portaria Presidencial de 11/02/1930, Jerônimo foi nomeado para participar da “Exploração Ferroviária no Centro Oeste”, pelo Ministério de Viação e Obras Públicas, e, meses depois, foi designado Engenheiro da Estrada de Ferro Goiás, quando passou a residir em Bonfim. Seguiu-se um período de muitas viagens, vistorias férreas, planejamento de obras, fiscalizações nos assentamentos de dormentes e trilhos, construções de pontes e Estações Ferroviárias. Em Bonfim, reencontra o amigo Arcebispo, Dom Emanuel, que para lá havia transferido sua prelazia. Com a amizade que os ligava, o auxilia em reformas e na construção do novo Seminário. Levou, pelo sistema de gravidade, água para a nova construção, nada cobrando pelos serviços prestados à Igreja porque era católico e sabia ser difícil a situação financeira do Arcebispado.

Em contato com Dr. Pedro Ludovico, na cidade de Goiás, logo após sua posse, ocorrida em 22 de novembro de 1930, soube dos planos de mudança da Capital e da necessidade de engenheiros com sua experiência, e, assim, aceitou, com a chama do ideal pioneiro, o convite para auxiliá-lo.

Por decreto de 15/01/1931, Jerônimo Augusto Curado Fleury foi nomeado Engenheiro do Estado de Goiás. Mas, somente no ano seguinte, por meio do Decreto nº 2.737 de 20/12/32, passou a participar, como Engenheiro, da Comissão encarregada de realizar os estudos atinentes a adaptação ou escolha do local para edificação da nova Capital do Estado. Essa Comissão foi Presidida pelo Arcebispo Dom Emanuel Gomes de Oliveira, e integrada pelo engenheiro do Estado Jerônimo Augusto C Fleury, pelo Urbanista e Engenheiro João Argenta, advogado Dr. Colemar Natal e Silva, Coronel do Exército Antônio Pirineus de Sousa1, médico Dr. Laudelino Gomes de Almeida, Chefe do Serviço Sanitário do Estado e Antônio Augusto de Santana e Gumercindo Alves Ferreira, comerciantes.

Para atender a esta designação, Jerônimo solicita licença por tempo indeterminado ao Ministério de Viação e Obras Públicas, sendo autorizada, no final de 1930, pelo então Presidente Getúlio Vargas.

De volta a Campininha de Goiás, aceita, novamente, o convite de Dom Emanuel, e passa a morar no Convento dos Padres Redentoristas, local onde residira anos atrás, quando elaborou a regulamentação das terras da Igreja.

Novamente, viajando sobre o lombo de um cavalo, Jerônimo realiza estudo de adaptação das cidades candidatas a receber a nova Capital do Estado e, também, sobre o aproveitamento e estudo das áreas de terras vizinhas das referidas cidades, no atendimento a pedido do Interventor Pedro Ludovico.

Realizou Jerônimo Augusto um minucioso trabalho de levantamento topográfico e hidrográfico, sendo as cidades de Campininha, Bela Vista e Bonfim as que melhor área aberta e plana possuíam em seu redor; além de bons mananciais d’água, capazes de abastecer a futura Capital goiana estimada a ter 50 mil habitantes nos próximos 50 anos.

Por essa época, algumas vezes, cavalgou em companhia de Dr. Pedro Ludovico, quando seguiam a cavalo num troteado cadenciado e sem pressa. A tudo observava Dr. Pedro: o grande planalto pouco acidentado que se descortinava a sua frente, a rasteira vegetação do cerrado onde floresciam as belas caraíbas e ipês, as pequenas nascentes que corriam para as baixadas e os grandes rios da região.

Nessas cavalgadas, Dr. Pedro se justificava dizendo que além do prazer de cavalgar - uma paixão que o relaxava - ele, como Interventor, necessitava conhecer in loco, e muito bem, todos os locais alvos de estudos, para também analisá-los, compará-los e então dar o veredito final. Jerônimo, que trabalhava com enorme prazer e consciência da importante missão que desempenhava, procurava esclarecer-lhe todas as dúvidas, relatando suas experiências e ponto de vista sobre seu serviço e sobre o momento político vivido.

concluído e apresentado pela Comissão, a decisão da escolha recaiu na grande chapada plana e alta, com leve declive para o norte, alguns quilômetros de Campinas de Goiás, região entre os córregos Criméia, Vaca Brava e Botafogo.

Meses depois, durante as festas do lançamento da Pedra Fundamental da nova Capital, dias 23, 24 e 25 de outubro de 1933, Jerônimo continuava a prestar serviço ao governo. Foi engenheiro auxiliar na construção dos prédios públicos e particulares ao lado do Eng. Coimbra Bueno e de outros, numa autêntica participação quando Goiânia, nos primeiros meses de construção, era ainda um grande e inacabado projeto.

Participou da festiva Missa Campal juntamente com o Desembargador Maurílio, seu pai, suas irmãs e as primas Rosarita e Maria das Graças, que também vieram da cidade de Goiás para os três dias de festas acompanhando o pai, Heitor Moraes Fleury, então Secretário Geral da Fazenda.

Após a Missa Campal, Jerônimo caminhou com o grupo de moças mostrando-lhes o belo planalto, e as poucas construções que pareciam brotar do chão vermelho em meio à campina verdejante e cheirosa de capim gordura, salpicada aqui e acolá de margaridas e boninas amarelas e brancas. Nesse dia, almoçando todos juntos, pode Jerônimo rever a prima Rosarita, depois de anos sem encontrá-la, se encantando com sua beleza morena.

Trabalho encerrado, Jerônimo retornou ao Rio de Janeiro, onde reassumiu seu serviço no Ministério. Como engenheiro técnico, utilizava o Código de Obras, oficial em todo o País, que fora publicado por Arthur Sabóia em 1929, conforme foto abaixo.

Por Decreto Presidencial de 31/07/1934, foi designado Engenheiro Técnico de 1ª. classe da “Comissão de Estudos dos Rios Tocantins e Araguaia”. Novamente, voltou a Goiás para executar com profissionalismo e responsabilidade a difícil tarefa de estudo dessas duas importantes bacias hidrográficas goianas. Passa meses acampado percorrendo todo o Rio Araguaia e o Rio Tocantins, medindo-os, analisando-os, registrando e calculando largura, fundura, as partes navegáveis ou não.

Nesse trabalho, foi possível tomar ciência de várias tribos indígenas, algumas não pacificadas. Passou por perigosos momentos arriscando a vida, seja em canoa pouco equipada ou nos perigos com os animais selvagens ou peçonhentos. Muitas vezes, nos fins de semana, resolvia sair à caça de alguma ave ou animal selvagem. No grupo de estudo apenas ele e mais dois amigos tinham o prazer em caçar.

Das histórias que contava, uma marcou-me mais, pois deixara no seu corpo eterna lembrança. Contava ele que, certo dia, já ao cair da tarde, saíra com o amigo para caçar. Na cozinha do acampamento somente o peixe era o alimento forte e ele sonhava com uma carne vermelha. O primeiro animal que cruzasse seu caminho teria destino certo: a panela. Pato selvagem, paca, seriema, tatu, tartaruga ou até uma onça pintada.

No dia seguinte comeriam carne vermelha caçada “custe o que custar”. Dessa vez, combinaram caminhar na mata de maneira separada, um para a direita e outro pela esquerda. Depois de certo tempo de mata cerrada e já escurecendo, Jerônimo escuta um barulho leve nas folhas secas do chão. Respiração contida, fica na espreita, espingarda no jeito, pensado tratar-se de uma onça pintada. De repente, ouve um tiro e, ao mesmo tempo, sente um calor imenso na cintura e agulhadas pelo corpo.

Instintivamente ele dá um pulo e grita. Vê, com surpresa, surgir há poucos metros de si, seu amigo assustado de espingarda nas mãos. Meu pai percebe então que acabara sendo caçado pelo amigo. Passado o susto, verificaram que por sorte não acontecera uma tragédia.

O tiro havia atingido o cinturão de couro largo e grosso, enfeitado de tachas de metal que trazia na cintura, espalhando inúmeros chumbinhos em seu corpo e braço, razão das dores que continuavam a queimar sua pele. No dia seguinte, o almoço com peixe foi o melhor dos cardápios.

Encerrado o serviço, novo decreto Presidencial de 5/07/1935 o designa Engenheiro Técnico do Departamento de Portos e Navegação do Rio de Janeiro para executar as seguintes obras: Levantamento e estudos da enseada de Copacabana e Fiscalização e reforma do Porto do Rio de Janeiro.

Por várias vezes ele voltou a passeio em Goiânia, acompanhando seu pai ou realizando pequenos trabalhos do Ministério. Em final de 1942 assume noivado com a prima Rosarita Fleury. Em 4 de março de 1943, casam-se em Goiânia, pela manhã, seguindo de automóvel até a estação de Leopoldo de Bulhões e de trem para o Rio de Janeiro, onde passam a morar. Havia promessa de ampliação das vagas de Engenheiro no quadro da Estrada de Ferro Goiás. Era desejo do casal de fixar residência em Goiás.

Pelo Decreto n.42, de 21/10/1943, Jerônimo foi nomeado Engenheiro Série 21, do Ministério de Viação e Obras Públicas. Por Portaria n.109, do mês seguinte, foi designado Engenheiro Chefe de Estudos do Porto de Paranaguá, no Paraná, e, finalmente, por Portaria de fevereiro de 1944, foi nomeado Engenheiro da Estrada de Ferro Goiás, quando retornou em março, com a esposa, para Goiânia.

Por outro Decreto de 1/08/1945, foi nomeado Engenheiro Especializado via Permanente da Estrada de Ferro de Goiás.

casal fixou residência em Ipameri, e, no ano seguinte, mudou para Araguari, então sede da Estrada de Ferro de Goiás. Iniciou para o casal, Jerônimo e Rosarita, nova fase de vida com a chegada dos filhos, a rotina da casa, o expediente no escritório da Estação e as constantes viagens de fiscalização das linhas férreas, expansão dos trilhos até a Capital Goiana e demais serviços pertinentes ao cargo.

Com boa experiência e grande vivência no trato com problemas técnicos da Estrada de Ferro e também de pessoal, Dr.Curado, como era chamado no ambiente de trabalho, era tranqüilo e seguro em seu jeito de administrar os problemas, transmitindo confiança e respeito aos funcionários e subordinados. Participou com eficiência das gestões dos Diretores, Engenheiro Álvaro da Cunha Neto, em 1948, e do Eng. Wenefredo Bacelar Portela, em1949, Eng. Antônio Carlos Zamith, 1949/50.

Por Decreto de 8/01/1950, assumiu Jerônimo Augusto Curado Fleury a Diretoria da Estrada de Ferro Goiás. Em sua gestão reforçou junto ao Governo Federal a necessidade de mais verbas para a continuidade dos trilhos que chegaram a Goiânia em 20 de maio de 1950 e que deveriam continuar, passando por Campinas, seguindo o planejamento aprovado do Governo Federal, até atingir a capital de Mato Grosso. Deu ênfase a uma gestão humanizada melhorando as condições de trabalho nas oficinas de máquinas, mediante a compra de maquinários modernos e reforma nos galpões, conforme estampa no jornal Gazeta do Triângulo, de 1950.

Por essa época, Jerônimo que já vinha com problemas de surdez, resolveu fazer nova consulta no Rio de Janeiro. Feito os exames, constatou-se que seu ouvido bom perdia aos poucos a capacidade de audição e, mais tarde, um aparelho auditivo seria necessário. Objeto ao qual não se adaptou e que detestava usar, queixando-se de constantes e insuportáveis ruídos.

Figura 5 – Nota sobre o quadro de pessoal da Estrada e Ferro Goiás. Recorte de jornal do Arquivo do Museu Ferroviário de Araguari, Minas Gerais.

23/2/1951, tomou posse como Diretor da Estrada de Ferro Goiás o Major Mauro Borges Teixeira, assumindo a Diretoria em Araguari em 17/03/1951. Jerônimo passou a auxiliá-lo emprestando-lhe experiência técnica, e com função na sub-Diretoria e chefia da Quarta Divisão Permanente.

O Major Mauro Borges iniciou uma gestão inovadora movimentando todos os departamentos, exigindo produção e eficiência, aumento da demanda das cargas, cobrando novas idéias, progresso, e agradando os funcionários e suas famílias. Sua esposa, a jovem e bonita Sra. Lourdes Stivalet Teixeira, inova com sua presença e trabalho a gestão do esposo, assumindo a área social, convocando as esposas dos engenheiros e funcionários graduados a colaborarem em várias frentes do serviço social, providenciando cursos culinários e domésticos e festas beneficentes. Culmina o primeiro ano de gestão com um festivo “Natal Ferroviário” inovador, com a presença do Papai Noel chegando em trem e distribuindo presentes aos filhos dos ferroviários.

Infelizmente, no segundo ano de muita atividade e trabalho, começaram os boatos maldosos sobre a diretoria e mudança da sede da Estrada de Ferro para Goiânia, motivando “diz que disse” e movimentando politicamente a cidade.

essa época Rosarita resolve providenciar a publicação do romance que há quatro anos vinha escrevendo, Elos da mesma corrente.

Meu pai, que desde o começo lia cada capítulo e a incentivava, mostra os originais ao Engenheiro Diretor Raul Cavalcante. Este, após a leitura, fica encantado com a obra e oferece a publicação pela gráfica da Estrada de Ferro, desde que eles (meus pais) providenciassem o papel.

Em novembro de 1952, chega a Goiânia2 o primeiro trem noturno da Estrada de Ferro Goiás. Não se sabe a data exata em que foi entregue ao público a bela Estação Ferroviária de Goiânia. A viagem em trem noturnos com leitos, também foi festivamente comemorada pelos araguarinos embora houvesse entre muitos cidadãos certa apreensão e desejo de que uma reviravolta política acontecesse impedindo a mudança da sede da Estrada de Ferro.

Na minha percepção de criança, notava a preocupação de meus pais com a situação causada pelo assunto da mudança entre os funcionários e os araguarinos. Algumas vezes, pude escutar pontas de conversas entre minha mãe e dona Lourdes comentando alguns acontecidos e ameaças recebidas pelo Diretor.

Tenho a lembrança que boa parte da diretoria se mudou de Araguari para Goiânia, acompanhando o Diretor, Major Mauro Borges Teixeira, em inicio de 1953. Entretanto, a seu pedido, meu pai, como subdiretor, permaneceu em Araguari com a missão de promover, paulatinamente, o restante da mudança dos escritórios sem traumas ao povo araguarino.

Em 24/02/1954, recebe o Major Mauro Borges a autorização da Diretoria Geral do Departamento Nacional de Estradas de Ferro para completar a transferência do restante dos escritórios e funcionários para a nova sede de Goiânia. Fora aprovado, portanto, o cronograma da mudança apresentado pelo diretor Mauro Borges, ficando certa a permanência em Araguari das Oficinas Gráficas, a Oficina de Máquinas e alguns outros setores.

Os meses que antecederam a mudança final foram difíceis e traumatizantes para meus pais e toda família. Haviam eles conquistado boas amizades na cidade nos quase dez anos de convivência, mas a idéia da mudança da sede da Estrada de Ferro continuava a ser rejeitada pelo povo araguarino.

Diante da espera final da mudança, muitos amigos de meus pais tornaram-se arredios, e alguns, inconformados. Recebeu ele proposta e apoio para se rebelar e não concretizar a mudança e, também, ameaças de morte.

Nada, entretanto, o intimidou e, firme em seu propósito, concretizou a mudança dos últimos funcionários e escritórios sabendo que deixava uma cidade maravilhosa de filhos aguerridos, gente fina, educada, lutadora. A sede da Estrada de Ferro de Goiás teria de ser na Capital do Estado do mesmo nome, Goiás!

Em Goiânia, nova vida e novos tempos.

Dr. Curado passou a trabalhar em uma das salas do antigo Quartel da Polícia Militar, ao lado da nova Estação Ferroviária de Goiânia, onde já funcionava a administração.

Para minha mãe, a alegria da mudança não foi completa. Deixara em Araguari os originais de seu livro Elos da mesma corrente, na Oficina Gráfica da Estrada de Ferro Goiás. Os bonecos dos capítulos vinham de trem e voltavam para Araguari, com a devida correção feita. Serviço moroso, ficando pronto somente no início do ano de 1958.

Por Decreto Presidencial, em 1957, Jerônimo foi promovido por merecimento à classe “O” de Engenheiro do Ministério de Viação e Obras Públicas, vindo a aposentar-se em 19 de dezembro de 1959.

Por alguns anos, trabalhou ainda como engenheiro civil, construindo salas comerciais e residências e administrando reformas.

No início da década de 1970, acompanha sua esposa, Rosarita e o filho Paulo Sérgio, em viagens de pesquisa para a cidade de Corumbá, no Estado de Mato Grosso, Paraguai, e outros lugares e cidades ajudando-a no término do romance Sombras em Marcha – na vivência da fuga, lançado em 1985.

Em seus últimos anos de vida não deixou o prazer de ler diariamente o Globo e jornais goianos. Passava as tardes em seu escritório onde se ocupava com leituras e elaboração de novos exercícios de palavras cruzadas e de um interessante dicionário para os amantes desse passa tempo.

Em 1980, 13 de agosto, já debilitado pela diabetes e problemas pulmonares, passa a conviver com a ausência de seu netinho Minho, de quatro anos, falecido em acidente e que levara o seu nome na Pia Batismal. Era ele seu companheiro diário no lanche das 10 horas da manhã, no almoço e em alguns passeios.

Um ano após o falecimento do netinho, em 14 de agosto de 1981, falece em Goiânia, aos 81 anos, o engenheiro Jerônimo Augusto Curado Fleury, deixando consternados os familiares e amigos, a esposa e companheira Maria do Rosário Fleury, mais conhecida por Rosarita Fleury e os filhos: 1- Maria Elizabeth Fleury Teixeira, Pedagoga, casada com o economista, Duval Teixeira e os filhos: 1.1 Lisbete Helena-divorciada e os filhos: Bruna Fleury Teixeira Martins e Wilson Martins da Costa Neto. 1.2 Ricardo, casado c/Anailma Araújo Gracioti e os filhos: Anelise e Rodrigo Gracioti Fleury Teixeira. 1.3 João Paulo Fleury Teixeira casado c/Marina Albuquerque Andrade e o filho: Heitor Andrade Fleury.

2 - João Luciano Curado Fleury, Advogado, casado com Margarida Siqueira Fleury, professora, e as filhas: 2.1Ana Flavia casada com Adriano A. Mariani e as filhas: Isadora e Cecília Siqueira Fleury Mariani; 2.2 Renata Siqueira Fleury casada c/Leandro Auad Figueiredo e os filhos: Ana Luz e João Pedro Fleury Auad Figueiredo

3 - Paulo Sérgio Curado Fleury, Aviador, casado com Valéria Vendeth Fleury e os filhos: 3.1 Waléria Cristina casada com Dr. Ronaldo Caixêta e os filhos: Alexandre Fleury Rezende, Paulo Sérgio Fleury Rezende e Vida Vendeth Fleury Caixêta. 3.2 Claudia Cristina casada com Nilo Fernando Guizzardi e o filho: Nilo Fernando Fleury Guizzardi; 3.3 Jerônimo A. Curado Fleury Neto (falecido em criança). 3.4 Jerônimo A. C. Fleury Neto Segundo ( falecido aos 22 anos) e 3.5 Pedro Paulo Vendeth Fleury.

NOTAS

Sobre a citada comissão, informa a Professora Nancy Helena Ribeiro que o Coronel Pirineus sugeriu ao Dr. Pedro Ludovico a instituição de uma sob comissão de técnicos para finalizar os trabalhos. Foram indicados os nomes de Jerônimo Augusto Curado Fleury, engenheiro, João Argenta, urbanista, e Laudelino Gomes de Almeida, médico e chefe do Serviço Sanitário do Estado. A informação encontra-se na Revista Perfil Cultural, da Academia Belavistense de Letras e Artes e Ciências ( ano 5, nº5, p.27-48), no artigo intitulado “O benemérito Antônio Cândido da Costa Morais”. A afirmação em epígrafe está calcada no estudo “A queda de Bonfim e a escolha prévia de Campinas”, de Jales Guedes Coelho Mendonça, publicado na Revista Mosaico, v.2, nº2, p.175-189, jul/dez.2009.

Chegam os trilhos a Goiânia: a construção, artigo de Lena Castello Branco, publicado na Revista Goiás Cultura do Conselho Estadual de Cultura, 2006.

Referências

BORGES, Mauro. Tempos idos e vividos: minhas experiências. Goiânia, Ed. Kelps, [s.d.], p. 159

FREITAS, Lena Castello Branco Ferreira de. Chegam os trilhos em Goiânia: a construção da Estação Ferroviária. Revista Goiás Cultura, ano 3, nº7,p.27, 2006

RELATÓRIOS DE INQUÉRITO SOCIAL – Araguari: Oficinas Gráficas da Estrada de Ferro Goiás, -1954.

REVISTAS DOS FERROVIÁRIOS – Araguari. Oficinas Gráficas da Estrada de Ferro Goiás, ano 6, ns 6e7, jan. 1953. Fundada na administração do Major mauro Borges.

SINTESE DOS RESULTADOS DE TRÊS ANOS DA ADMINISTRAÇÃO DO MAJOR MAURO BORGES TEIXEIRA. Araguari: – Oficinas Gráficas da Estrada de Ferro Goiás, 1954.